Discursos nas Políticas de Currículo

Ano: 2011

Organizador(es): Alice Casimiro Lopes, Rosanne Evangelista Dias e Rozana Gomes de Abreu

Editora: Quartet

Número de Páginas:

ISBN:

Apresentação:

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Os textos aqui reunidos expressam os resultados de uma trajetória de pesquisa que temos realizado em conjunto nos últimos cinco anos, com destaque para os resultados dos projetos de pesquisa A produção de políticas de currículo em contextos disciplinares (2005-2008) e Articulação nas Políticas de Currículo: o caso das Ciências no Ensino Médio (2008-2011), coordenados por Alice Casimiro Lopes, ambos financiados pelo CNPq, pela Uerj e pela Faperj, e do projeto de pesquisa Processos de articulação e produção de sentidos nas políticas curriculares de formação de professores (2010-2013), coordenado por Rosanne Evangelista Dias, financiado pelo CNPq e pela UFRJ, todos os três desenvolvidos no âmbito do grupo Políticas de currículo e cultura (UERJ). Mas também apresentam alguns ecos de uma parceria entre as organizadoras iniciada há mais de dez anos, sempre pesquisando no campo do Currículo. A intenção de publicar este livro se coloca, portanto, em dois níveis distintos.

O primeiro deles, que por si só justifica a edição, é o de socializar os resultados das investigações que o grupo vem desenvolvendo sobre políticas de currículo. Destacamos inicialmente as questões teórico-metodológicas norteadoras de todas as pesquisas e buscamos em cada texto apresentar as conclusões das análises da empiria, as opções metodológicas particulares, necessárias para dar conta de questões de cada investigação. Dessa forma, investigamos particularmente como comunidades disciplinares e epistêmicas têm produzido sentidos e influenciado discursos em políticas de currículo, sejam eles postos em circulação no contexto da definição de textos ou no contexto da prática das escolas. Como materiais empíricos, focalizamos, então, documentos curriculares – assinados ou não por instâncias governamentais –, textos produzidos em diversos campos disciplinares e entrevistas com atores sociais nos diferentes contextos de investigação. Considerando as dimensões de política como texto e política como discurso de Stephen Ball, bem como procurando avançar, com Ernesto Laclau, no sentido de entender os processos de articulação de demandas que favorecem a hegemonização de certos discursos, desenvolvemos nossas pesquisas.

Em um segundo nível – para além da socialização, altamente necessária, de resultados de pesquisas financiadas com verbas públicas –, temos a intenção de apresentar o processo de trabalho coletivo do grupo. Nesse grupo, atuam bolsistas de iniciação científica, mestrandos, doutorandos, doutores e pós-doutorandos, que sob orientação da coordenadora do grupo, Alice Casimiro Lopes, trabalham em parceria no estudo que embasa a pesquisa e, em alguns momentos, na escrita dos textos que expressam os resultados da mesma. No caso deste livro, além desse trabalho de autoria conjunta, que foi estimulada de forma a garantir textos mais sólidos, houve também o trabalho de edição das organizadoras, lendo os textos aqui incluídos e apresentando sugestões na escrita final. Consideramos que essa forma de trabalho coletivo permite aprofundar as discussões teóricas, ampliar o escopo do material empírico analisado e alçar vôos metodológicos mais instigantes.

O trabalho coletivo também implica assumir concepções comuns, sendo uma das mais importantes o entendimento do currículo como uma produção cultural. Desse modo, buscamos nos afastar das perspectivas que ainda mantêm alguma forma essencialista e reificada do currículo, concebendo-o como seleção de conteúdos de um repertório cultural mais amplo. Trabalhamos na perspectiva de entender o currículo como produção cultural e, assim, compreendê-lo como um processo político, no qual estamos, em diferentes espaços e tempos, disputando quais significações discursivas são hegemonizadas. Dentre elas, situam-se as significações do que vem a ser conhecimento, mas também avaliação, aluno, professor, disciplina, qualidade de ensino, cidadania, mudança, enfim, a multiplicidade de significantes que circulam e têm seus sentidos fixados provisoriamente nessa formação discursiva.

Visando a tentar dar conta dessa proposta, no primeiro texto, Políticas de currículo: questões teórico-metodológicas, Alice Casimiro Lopes apresenta as principais discussões que embasam as pesquisas do grupo. É apresentado como desenvolvemos o diálogo com as interpretações contemporâneas das ciências sociais sobre políticas, enfatizando as contribuições que trazem para a abordagem do ciclo de políticas. A autora analisa o ciclo de políticas de Ball, mas tendo em vista a leitura própria do grupo sobre as abordagens do autor – seus limites e suas potencialidades. Justificando a incorporação da teoria do discurso para investigação das políticas de currículo, são analisadas as concepções de articulação, significante vazio, ponto nodal e hegemonia utilizadas. Posteriormente, é justificado o foco nas demandas educacionais e nos textos curriculares.

Em seguida, organizamos os trabalhos aqui apresentados em três grandes blocos inter-relacionados: Comunidades Disciplinares, Contextos da Prática e Comunidades Epistêmicas.

No primeiro bloco, reunimos as pesquisas que focalizam os significados postos em circulação por comunidades disciplinares específicas que produzem discursos visando a significar as políticas de currículo.

Iniciamos com o texto de Ana de Oliveira, intitulado Rede de (re)significações nas políticas curriculares: a Revista Brasileira de História na década de 1980, no qual a autora apresenta a trajetória metodológica de sua pesquisa sobre sentidos e significados que a comunidade disciplinar de História insere nas políticas de currículo. A autora apresenta um modelo analítico com base na teoria do discurso, visando a investigar uma das mais importantes produções no campo da História, periódico no qual também se debate o ensino dessa disciplina e, especialmente, a formação de professores nessa área.

No capítulo, Integração curricular, inter|disciplinaridade e Geografia em propostas curriculares nacionais, Hugo Camilo Costa e Alice Casimiro Lopes focalizam o significante interdisciplinaridade por entendê-lo como central na defesa do currículo integrado para a Área de Ciências Humanas e suas Tecnologias no nível médio de ensino e, mais particularmente, no texto proposto para Geografia. Argumentam que tal defesa se faz, também, com base no conhecimento científico geográfico, interpretado como epistemologicamente interdisciplinar, sendo este aspecto analisado por esta comunidade disciplinar como uma vantagem da área no contexto da proposta de integração curricular.

Flávia Busnardo Giovannini, Rozana Gomes de Abreu e Alice Casimiro Lopes apresentam o texto Proposta curriculares para Biologia no nível médio: dissensos e negociações. Neste capítulo, as autoras analisam os principais documentos curriculares relacionados à Biologia no nível médio de ensino produzidos em âmbito federal desde o fim dos anos 1990, bem como entrevistas com professores e pesquisadores participantes da elaboração desses documentos curriculares, visando a identificar dissensos e negociações no âmbito dessa comunidade disciplinar. A partir daí, concluem haver, nessa área de ensino, uma ampliação do enfoque prescritivo dos documentos curriculares, ainda que não se trate de uma posição consensual na comunidade disciplinar de ensino de Biologia.

Finalizando o primeiro bloco, no texto Políticas curriculares para o ensino de química: discursos sobre contextualização e cotidiano, Rozana Gomes de Abreu analisa como os discursos de contextualização e cotidiano são ressignificados nas políticas de currículo para o ensino de Química. Nesta análise, a autora apresenta diferentes sentidos desses discursos para a comunidade disciplinar de ensino e as articulações discursivas envolvidas na produção e significação das políticas curriculares para o nível médio. A autora defende que o discurso da contextualização tem conseguido articular e agregar diferentes demandas, potencializando a ação da comunidade no processo de significação das políticas curriculares.

No segundo bloco, por sua vez, os textos Política de currículo na escola: sentidos de democracia, de Danielle dos Santos Matheus e Alice Casimiro Lopes, e Políticas de currículo: sentidos produzidos em escolas de formação de professores, de Josefina Carmen Diaz de Mello dão destaque ao contexto da prática. No primeiro texto, as autoras investigam documentos curriculares que circulam em uma escola de nível fundamental, bem como entrevistam professores de diferentes disciplinas nessa escola, procurando compreender que sentidos de democracia operam nessa política curricular. Defendem, assim, o quanto as disputas em torno da compreensão de democracia contribuem para o próprio caráter democrático da reforma. No segundo texto, são focalizadas as (re)interpretações que professores de Didática e de Sociologia da Educação em duas escolas de formação de professores em nível médio fazem de documentos curriculares oficiais. É defendido como são realizadas leituras distintas em um mesmo universo político-discursivo.

No terceiro bloco, são reunidos os textos decorrentes de pesquisas que focalizam a ação política de comunidades epistêmicas. O capítulo intitulado Políticas curriculares nacionais para a formação da identidade docente, da autoria de Clarissa Bastos Craveiro e Rosanne Evangelista Dias, tem o objetivo de analisar os sentidos atribuídos à identidade docente em três textos políticos influentes na formação de professores no Brasil: o Relatório Jacques Delors, os Referenciais para Formação de Professores e o Exame Nacional de Ingresso na Carreira Docente. As autoras defendem a não-fixação da identidade docente e problematizam a ideia de estabelecimento de um perfil profissional para uma profissão marcada pela heterogeneidade, tendo em vista que essa projeção de padrões profissionais acaba por restringir o escopo plural e multifacetado da formação do professor.

Wagner Torres e Rosanne Evangelista Dias, por sua vez, no capítulo intitulado Comunidades Epistêmicas nas políticas de currículo em EJA, analisam a atuação das comunidades epistêmicas no processo de produção das políticas de currículo em EJA (Educação de Jovens e Adultos), com foco no relatório final da VI CONFINTEA (Conferência Internacional de Educação de Adultos), realizada em Belém do Pará, em 2009. Os autores identificam os diagnósticos e as soluções apresentadas para o currículo em EJA. É defendido como tal discurso vem sendo capaz de interferir na produção das políticas de currículo no campo.

No capítulo, Demandas e processos de articulação nas políticas curriculares da formação de professores, Rosanne Evangelista Dias destaca a produção de discursos pela integração curricular na formação de professores. São analisados textos apresentados em eventos da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Educação – Anped e da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação – Anfope, bem como nos Encontros Nacionais de Didática e Prática de Ensino – Endipe, no período de 1994 a 2006, e textos de definições curriculares dirigidas à formação de professores no período de 2001 a 2005 – Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores e para o Curso de Pedagogia. Essa análise aponta para uma pluralidade de autores e sentidos, de leituras e de interpretações, influenciada pelas contingências que resultam em ações políticas como acordos e formação de agendas. Dessa forma, as políticas mostram-se marcadas por uma ambivalência de projetos.

Por fim, ainda explorando as políticas para formação de professores, Tânia Maria Lima Beraldo, no capítulo O que há de novo nas licenciaturas integradas na área de Ciências? , busca contribuir com o debate sobre as licenciaturas que estão sendo propostas para a formação de docentes da área de Ciências, procurando identificar os argumentos adotados atualmente para a oferta de cursos de licenciaturas integradas e os princípios de integração curricular defendidos. A questão sobre o que há de novo nos projetos de tais cursos é enfrentada por meio da busca de relações entre a oferta de licenciatura integrada em décadas anteriores (1960/1970) e a oferta desse tipo de curso na atualidade. Dessa forma, visa a entender que outras demandas entram em jogo na política de formação de professores.

Apresentamos ao leitor este livro com a expectativa de que os textos possam ser submetidos ao debate, mas que também, quem sabe, possam inspirar outros grupos em investigações sobre currículo e políticas de currículo, seja pela concordância, pelo complemento ou pela crítica de nossas conclusões.

Alice Casimiro Lopes, Rosanne Evangelista Dias e Rozana Gomes de Abreu

Sumário:

APRESENTAÇÃO
1. POLÍTICAS DE CURRÍCULO: QUESTÕES TEÓRICO-METODOLÓGICAS
Alice Casimiro Lopes
COMUNIDADES DISCIPLINARES
2. REDE DE (RE)SIGNIFICAÇÕES NAS POLÍTICAS CURRICULARES: A REVISTA BRASILEIRA DE HISTÓRIA NA DÉCADA DE 1980
Ana de Oliveira
3. INTEGRAÇÃO CURRICULAR, INTER|DISCIPLINARIDADE E GEOGRAFIA EM PROPOSTAS CURRICULARES NACIONAIS
Hugo Camilo Costa & Alice Casimiro Lopes
4. PROPOSTAS CURRICULARES PARA BIOLOGIA NO NÍVEL MÉDIO: DISSENSOS E NEGOCIAÇÕES
Flávia de Mattos Giovannini Busnardo, Rozana Gomes de Abreu & Alice Casimiro Lopes
5. POLÍTICAS CURRICULARES PARA O ENSINO DE QUÍMICA: DISCURSOS SOBRE CONTEXTUALIZAÇÃO E COTIDIANO
Rozana Gomes de Abreu
CONTEXTOS DA PRÁTICA
6. POLÍTICA DE CURRÍCULO NA ESCOLA: SENTIDOS DE DEMOCRACIA
Danielle dos Santos Matheus & Alice Casimiro Lopes
7. POLÍTICAS DE CURRÍCULO: SENTIDOS PRODUZIDOS EM ESCOLAS DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Josefina Carmen Diaz de Mello
COMUNIDADES EPISTÊMICAS
8. POLÍTICAS CURRICULARES NACIONAIS PARA A FORMAÇÃO DA IDENTIDADE DOCENTE
Clarissa Bastos Craveiro & Rosanne Evangelista Dias
9. COMUNIDADES EPISTÊMICAS NAS POLÍTICAS DE CURRÍCULO EM EJA
Wagner Torres & Rosanne Evangelista Dias
10. DEMANDAS SOBRE INTEGRAÇÃO NAS POLÍTICAS CURRICULARES DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Wagner Torres & Rosanne Evangelista Dias
11. O QUE HÁ DE NOVO NAS LICENCIATURAS INTEGRADAS NA ÁREA DE CIÊNCIAS?
Tânia Maria de Lima Beraldo